Artigo de Roberto von der Osten: Só a luta te garante!

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Só a luta te garante!

Nunca uma frase disse tanto sobre a conjuntura e sobre a vida!

Começamos a Campanha Nacional deste ano num cenário de crise econômica, de instabilidade política, de violentos ataques aos trabalhadores e em plena efervescência do processo de impeachment da presidenta Dilma.

Apesar desta conjuntura desestimuladora, sabíamos estar iniciando uma negociação com o setor que mais lucra na economia do país. Não deveriam ter problemas de ordem financeira para atender nossas reivindicações. Entretanto, escaldados pela campanha de 2015, antevíamos confusão.

A cuidadosa escolha da imagem e do mote da campanha dialogaram com a delicadeza da rosa vermelha para lembrar as discriminações que as pessoas sofrem nos bancos. A construção da figura da rosa somou os símbolos da igualdade, resistência, luta e tolerância.

Como mote adotamos a frase “Só a luta te garante!”, lembrando que não adianta ficar passivo no local de trabalho sem envolvimento na greve. A demissão, o assédio moral, o adoecimento, as discriminações e a exploração atingem principalmente as pessoas que não se defendem. Foram escolhas muito felizes.

No aspecto da organização, cumprimos todos os rituais de nossa campanha. A consulta nacional, os debates nos sindicatos, as conferências regionais e a Conferência Nacional. Entregamos nossa Minuta de Reivindicações aos banqueiros no dia 9 de agosto e iniciamos as negociações em 18 e 19 de agosto.

Rapidamente percebemos que os banqueiros pretendiam impor uma derrota exemplar para os bancários. Após infrutíferas rodadas de negociação, os banqueiros só foram capazes de nos apresentar uma proposta de reajuste de salários de 6,5%, feita no dia 29 de agosto, diante de uma inflação de 9,62%.

No dia seguinte a esta proposta a presidenta Dilma foi impedida, assumindo a presidência o seu vice, Temer. As coisas ficavam mais claras.

O Comando Nacional dos Bancários avaliou que esta proposta insuficiente estava seguramente vinculada à mudança de direção do governo, afinal o presidente que assumia nunca escondeu seus objetivos de atacar direitos fundamentais dos trabalhadores.

A coordenação do Comando comunicou aos banqueiros que levaria a proposta às assembleias de avaliação, mas que defenderia a sua recusa. Nada disso alterou a posição intransigente dos bancos.

As assembleias decidiram por quase unanimidade que a gente entraria em greve a partir do dia 6 de setembro. Isto de cara era um desafio. Seríamos a primeira grande categoria a entrar em greve após a posse de um governo golpista, privatista e neoliberal.

Tudo apontava para um feroz enfrentamento. De um lado os bancários, uma categoria de grande mobilização, articulados em uma unidade nacional de grande poder de ação. De outro os banqueiros, o segmento mais poderoso da economia e os organizadores da linha macroeconômica do governo. Foram os escalados para dar uma demonstração de força para o movimento sindical, mostrando que os tempos mudaram e que agora o jogo é bruto.

Iniciamos a mais longa greve da categoria, que ligeiro adquiriu uma força que surpreendeu os banqueiros. Diferente do que tinham projetado, tiveram de ir mudando suas ofertas e retomando as negociações interrompidas para desestabilizar o movimento.

Desde o primeiro dia da greve os nossos dirigentes assumiram o protagonismo do enfrentamento. Resolveram que era preciso resistir. Não aceitaram a derrota que os banqueiros queriam impor.

Surpreendentemente animados, com bom humor e coragem, a greve cresceu. Começamos com a adesão de 7.359 agências e no 14º dia já estávamos com mais de 13 mil agências e 36 centros administrativos paralisados, número superior ao 21° dia da greve de 2015.

Os bancários e bancárias da base, que não haviam entendido as lutas dos sindicatos desde o início do ano em defesa da democracia e de nossos direitos, começaram a se reaproximar por entenderem que coisa pior estava por trás da dureza dos banqueiros. Sentiram confiança e que estavam bem representados. Isto estimulou e redobrou a coragem dos dirigentes sindicais.

O Comando Nacional, por sua vez, conseguiu rapidamente decodificar, ter clareza e serenidade para tomar as decisões corretas em meio aos diferentes caminhos e escolhas que se apresentaram no processo das negociações.

Foram 31 dias de lutas, de ansiedade e de muita força de vontade até a assembleia que aceitou a proposta que conquistamos dos bancos. É bem verdade que não conseguimos a reposição de inflação, mas conseguimos algo muito maior, a oportunidade de politização e o respeito da categoria que representamos. Se o acordo não é o dos nossos sonhos, está longe também de ser a derrota que os banqueiros desejavam nos impor.

Inauguramos uma nova era nas nossas negociações com o acordo inédito de dois anos. Um novo momento se apresenta para o movimento sindical bancário brasileiro. Chegou a hora de provar que a nossa luta não é só por índice de reajuste. Vamos nos organizar mais e defender as pautas que também são fundamentais, para além da remuneração. O tiro dos banqueiros saiu pela culatra.

A conquista do abono dos dias parados coroou a campanha e calou os que duvidavam da nossa capacidade de luta na conjuntura adversa. Prevista para ser utilizada como punição para todos os trabalhadores e seus sindicatos, foi derrotada pela nossa tenacidade.

Agora é a oportunidade de render homenagens aos dirigentes sindicais que tiveram a capacidade de dobrar os banqueiros e sair vitoriosos da primeira grande greve, num momento de virada na correlação de forças e na luta de classes. Cada sindicato participou orgulhosamente e todos os dias mandaram para a Contraf suas fotos, suas conquistas e suas ousadias. Não ficaram na defensiva.

Mas temos que parabenizar principalmente a categoria bancária, esta categoria orgulhosa da sua mobilização e da sua unidade. Cada bancário e cada bancária, por todo o Brasil, em todas as cidades, estiveram disciplinadamente, pacificamente e convictos na frente de uma agência ou centro administrativo conversando com os companheiros de trabalho, animando, encorajando, convencendo, dizendo que coragem não é não ter medo. É dominar o medo. Foram dias e dias de paciência e de fé verdadeiras.

Outras categorias imediatamente homenagearam nossa Campanha Nacional pela coragem e pelo resultado. Diversos textos de análise acadêmica relataram o ineditismo da campanha e a magnitude da nossa resistência.

Se o governo e os banqueiros pretendiam nos derrotar e fazer da nossa derrota um aviso para todas as outras categorias, não deu certo. Pelo contrário, mostramos que é possível lutar contra eles. Mostramos que com mobilização, com a unidade e com a capacidade de negociação dos trabalhadores podemos garantir direitos e avançar, mesmo nas condições mais imprevisíveis.

Somos um exemplo de luta, de criatividade e de resistência.

Só a luta te garante!

*Roberto von der Osten é presidente da Contraf-CUT e um dos coordenadores do Comando Nacional dos Bancários

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