Banco Central passa a rastrear créditos fora do balanço dos bancos

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A partir deste ano, quando o Banco Central for avaliar o risco de crédito do sistema financeiro, pouco importará se um crédito está no balanço dos bancos ou em fundos de investimento. Em ambos os casos, a autoridade estará com a lupa a postos para analisar o risco de inadimplência dos tomadores de empréstimos e, consequentemente, a saúde das instituições financeiras.

A constatação da autoridade foi que os empréstimos vinham sendo tratados de forma menos rigorosa quando estavam fora dos livros dos bancos, o que embutia um potencial de trazer problemas para o sistema. Eram bilhões que estavam fugindo da central de risco do Banco Central.

É o que a autoridade chama de “sistema financeiro à sombra” – veículos e empresas com atividade semelhante à de um banco, a exemplo dos fundos de investimento e securitizadoras. “Essa é uma das maiores preocupações hoje do BC”, disse Carlos Donizeti Macedo Maia, chefe do departamento de supervisão do BC, durante evento na semana passada. No Morada, a venda de créditos podres para uma empresa não-financeira controlada pelos mesmos donos do banco foi um dos fatores que levaram à liquidação.

O recado já foi dado pelo BC às instituições em 2011. A partir deste ano, a autoridade exige mensalmente um detalhamento das operações que estão fora do balanço, como nome do tomador do empréstimo, risco atribuído a ele, parcelas não pagas e taxas cobradas.

De posse disso, o BC vai conseguir cruzar o risco entre os créditos acima de R$ 1 mil que estão dentro e fora de balanço, exigindo de bancos e fundos o mesmo tratamento em termos de provisão. É um trabalho feito a quatro mãos, unindo Banco Central e Comissão de Valores Mobiliários. A partir de 2013, o Banco Central também vai exigir que os bancos reservem capital para as atividades que envolvam crédito fora de balanço.

Alguns bancos carregam parcelas significativas dos créditos em fundos ou vendem empréstimos para companhias que não têm obrigação de prestar informações ao BC. O Cruzeiro do Sul, especializado em crédito consignado, por exemplo, carrega quase 100% da sua carteira em fundos de direitos creditórios. São cerca de R$ 8 bilhões.

Diante da fiscalização mais rigorosa do Banco Central já no ano passado, bancos como Cruzeiro do Sul, Votorantim e Bicbanco informaram nos balanço do fim de 2011 que tornaram as provisões para créditos cedidos mais rigorosas. O resultado foi um salto nas despesas para créditos duvidosos.

No caso do Cruzeiro, essas provisões para fundos de direitos creditórios somaram R$ 136 milhões, sendo que no ano anterior o balanço não registrava nenhum gasto para esse tipo de operação. No caso do Bic, foram cerca de R$ 100 milhões.

O Valor apurou que era bastante comum os bancos atribuírem nota de risco de crédito diferente para as operações que estavam dentro e fora de seus balanços. Um cliente que era tido como mais arriscado dentro da instituição financeira podia receber uma classificação bem mais amena do fundo. A partir de agora, porém, essas informações serão cruzadas pelo Banco Central.

Outro recurso usado era postergar a constituição de reservas para calotes. Se uma parcela de uma operação de crédito vencesse dentro de um fundo, só se fazia a provisão daquela parcela vencida e não do que ainda estava por vencer. Dentro de um banco, isso enseja a necessidade de uma provisão sobre o valor total do empréstimo.

Além disso, em geral, as provisões em fundos de direitos creditórios só ocorriam no momento em que um calote era registrado. Em instituições financeiras, dependendo do risco do tomador do empréstimo, as reservas são adotadas mesmo quando a operação está sendo paga em dia.

Além de cruzar as informações dos créditos que estão dentro e fora do balanço, o Banco Central também mudou a partir deste ano a forma como os bancos registram o lucro com a venda de créditos. O resultado não poderá ser reconhecido no ato da venda se a instituição continuar carregando o risco das operações. Isso porque o banco continuará responsável por uma eventual inadimplência.

“A retenção do risco que antes não estava no balanço [dos bancos]é o grande mote dessa norma”, disse Maia. “É fundamental trazer esses dados para dentro de um ambiente de maior controle e transparência”, acrescentou.

Os bancos que costumam originar novos créditos a partir do ganho obtido com as cessões de carteiras – movimento conhecido no jargão de mercado como “pedalada” – terão o desafio de rever esse modelo de atuação.

O técnico do BC admite também a possibilidade de instituições pequenas e médias passarem po fusões e aquisições a partir da implementação das novas regras de contabilização das cessões de crédito. “É preciso ter resultado saudável para enfrentar os ajustes”, diz.

Fonte: Valor Econômico

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