Visibilidade trans: Ser diferente é normal

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Por Adilson Barros*

No dia 29 de Janeiro é comemorado o Dia da Visibilidade Trans (Travestis e pessoas trans). Este dia surgiu em janeiro de 2004, no Governo Lula, por conta do lançamento da Campanha Nacional “Travesti e Respeito”, do Ministério da Saúde. Nesse dia, representantes da Articulação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) estiveram no Congresso Nacional, em Brasília, para lançar nacionalmente a campanha.

Dessa iniciativa, diversas organizações afiliadas à Antra foram orientadas a sair às ruas para comemorar essa data em todo o país, para mostrar suas caras e consequentemente reivindicar seus direitos. Sustentando desde então, a necessidade, numa ótica cidadã em “viver de dia”.

Mas, quando se fala em visibilidade, o que se quer dizer com isso? Significa primariamente que travestis e transexuais continuam invisíveis do ponto de vista do respeito aos direitos e da dignidade tanto para o governo, quanto para a sociedade como um todo. E no mundo LGBTI não é muito diferente, infelizmente.

Há um sentimento generalizado de que toda vez que uma travesti ou uma mulher/homem transexual aparecer na mídia, salvaguardando raras exceções, será para ridicularizá-las nos programas de humor que só o que fazem é reforçar o estereótipo e o preconceito de que elas são mulheres ou homens, invalidando suas identidades femininas/masculinas ou como exibição em programas de entretenimento, onde geralmente, o apresentador fará o que a claque ou o telespectador deseja: transformará essa pessoa em peça de Jardim Zoológico ou Circo de Aberrações.

A sociedade infelizmente tem um entendimento distorcido em ver e associar travestis e transexuais ao mundo da criminalidade e prostituição, sendo assim, jamais vê-las como vítimas, ou parte integrante de uma sociedade. A maioria das trans, principalmente as travestis, são agredidas, estupradas ou assassinadas, com justificativas de que elas são prostitutas e vivem à margem da sociedade. Isso tudo com um consentimento do “poder público” corroborando com as estatísticas de violência contra este segmento. E quase em todos os casos, sem direito de defesa, numa avaliação que a transfobia é algo inexistente. Vamos imaginar esta situação no mundo do trabalho. Onde muitas ainda são invisíveis. Com algumas exceções nas empresas públicas.

Recentemente, a cantora trans Pablo Vittar e a jogadora de vôlei Tifanny, foram incompreendidas e atacadas em redes sociais por pessoas que não entendem o diferente e não reconhecem suas identidades de gênero. Uma mentalidade atrasada de quem não aceita suas diferenças. Tudo isso dentro de uma lógica padronizada pela heteronormatividade.

Aliás, o próprio termo “travesti” é frequentemente usado no masculino, e do mesmo modo a mídia prefere frisar o nome do RG dessas pessoas, como se o que elas pensam e a forma como preferem ser tratadas – no feminino: A travesti – numa mentalidade opressora e patriarcal. E como se o nome social fosse algo não importante, e o do RG fosse estritamente necessário para entendermos e ter maior compreensão sobre ELAS.

As pesquisas mostram o significado do que é ser uma trans (travesti ou transexual) no Brasil. Basta um simples olhar para descobrir todo o universo e o significado de sua luta no dia a dia. Geralmente elas estão sempre preparadas para receber toda forma de discriminação: xingamentos, deboches e humilhações em todos os lugares. Exceto nos seus “espaços” onde ainda se sentem protegidas contra qualquer tipo de violência.

Os dados sobre violência e morte são alarmantes. Cerca de 90% delas estão à margem da sociedade e na invisibilidade. Quando não aceitas no mercado de trabalho, a ampla maioria fica na prostituição, suscetível a agressões seguidas de morte. O Brasil é o país onde mais se mata travestis e transexuais no mundo. Entre janeiro de 2008 e março de 2017, foram registradas mais de 600 casos no país. Não existem dados oficiais sobre estes casos, já que o poder público registra como “homens vestidos de mulher”.

De um modo geral, vemos o desrespeito às diárias agressões e a incompreensão por parte dos pais e da família. Em muitos casos são expulsas de suas casas ou forçadas a sair dado o histórico de violência. Sem ter onde morar, acabam tantas vezes caindo nas garras das cafetinas e cafetões que lhes oferecem um lugar para dormir em troca de trabalho: a prostituição.

Durante a vida escolar, geralmente verifica-se o fenômeno da evasão, já que a maioria acaba por não aguentar as agressões diárias vindas não apenas dos demais alunos, mas também daqueles que deveriam protegê-las: professores e gestores escolares que insistem em afirmar que a identidade de gênero que elas dizem possuir é inválida, mentirosa, fantasiosa, negando-se a trata-las pelo nome social.

Sem escolaridade, tudo parece ficar extraordinariamente mais difícil quando o assunto é trabalho – que já é dificultado a qualquer uma, independentemente de estudo, pelo grande preconceito do empresariado que, grosso modo, não quer em seu quadro funcional pessoas que a sociedade associa ao crime, ao errado, e sem reconhecimento do seu papel na sociedade.

Para os representantes da classe trabalhadora e de uma categoria com referência de luta, principalmente sobre a questão da diversidade, estamos avançando cada vez mais nos debates. Desde 2009, na “Mesa de Igualdade de Oportunidades” conquistamos o nome social nos crachás para os que reivindicarem, cláusula para os casais homoafetivos, em união estável os mesmos direitos previdenciários dos casais heterossexuais. E realização do programa de valorização da diversidade.

Estamos em plena campanha Nacional para combater de forma efetiva o preconceito e discriminação. É preciso sensibilizar os trabalhadores e toda sociedade sobre a comunidade LGBTI.

E queremos avançar ainda mais, apesar de tamanho retrocesso aos direitos LGBTIs. Assim, a luta não é apenas em busca da cidadania, mas também pelo acesso à educação e sua inserção no mercado de trabalho.

Este ano estamos no “Ano dos Direitos Humanos”, mas apesar de alguns avanços no campo dos direitos, existem grupos fundamentalistas construindo uma pauta conservadora para retirá-los. Ainda há muito enfrentamento para combater o preconceito e a discriminação. Precisamos defender ou buscar leis que punam os que discriminem e agridem os LGBTIs. O projeto de lei 122 – Combate à homofobia foi arquivado, infelizmente.

Juntos podemos parar a violência e a discriminação contra pessoas LGBTIs.

“Não Precisa ser para Sentir”

“Nenhum Direito à menos”

 

*Adilson Barros: bancário, militante LGBTI, e membro da diretoria executiva da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT).

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