Na manhã da última sexta-feira (3), a 1ª Conferência Nacional por Inteligência Artificial com Direitos Sociais, realizada na Universidade Federal do ABC, no campus São Bernardo do Campo, contou com um debate central para o futuro do Brasil: a soberania digital.
Participaram da mesa o sociólogo e professor da UFABC Sérgio Amadeu, referência na defesa da democratização da comunicação e da soberania tecnológica, e a cientista da computação Nina da Hora, pesquisadora que tem se dedicado a discutir os impactos sociais da tecnologia.
Amadeu chamou atenção para a dependência crescente do Brasil em relação às grandes corporações de tecnologia, responsáveis por concentrar dados e infraestrutura. Segundo ele, as chamadas big techs não apenas controlam gigantescos datacenters espalhados pelo mundo, mas também transformam a informação em um novo tipo de linha de montagem, que movimenta bilhões de acessos diários.
“A pergunta é: nós vamos aceitar o papel de usuário ou vamos afirmar que tecnologia é expressão da cultura de um povo? Sem soberania digital, sem soberania de dados, não haverá soberania nacional”, afirmou.
O professor criticou a entrega de informações estratégicas a empresas estrangeiras, lembrando que órgãos públicos e universidades brasileiras já armazenam parte de suas bases em serviços como Microsoft e Google. Ele citou como exemplo o caso de 2019, quando o Ministério da Educação transferiu para a nuvem da Microsoft os dados do Enem, considerados estratégicos para compreender o desempenho escolar da juventude brasileira.
Amadeu também alertou para os impactos ambientais da expansão de datacenters, que consomem grandes quantidades de energia e água. “Essas infraestruturas estão vindo para o Brasil atraídas por incentivos fiscais e pelo acesso à nossa energia. Mas seu custo ambiental já supera setores como aviação e agricultura”, ressaltou.
Já Nina da Hora destacou a importância de democratizar o debate sobre o uso das novas tecnologias e não permitir que a sociedade naturalize a ideia de substituição de pessoas por sistemas de inteligência artificial. Para ela, é necessário ampliar os espaços de reflexão e garantir que diferentes gerações participem da construção de alternativas.
“Precisamos de um encontro de gerações. Não podemos perder o que já foi conquistado na luta até agora, mas também não podemos deixar de olhar para o que está por vir. Hackear esse processo passa por articulação política, cultural e social, não apenas técnica”, disse.
O debate reforçou que, diante da centralidade dos dados e da infraestrutura tecnológica na economia, na educação e até na defesa militar, lutar pela soberania digital é lutar pelo próprio futuro do país.
Fonte: CUT SP