O Dia da Mulher

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*Por Alexandra Kollontai

As mulheres que formam o Sindicato dos Bancários do Pará: Rosalina Amorim, presidentaO quê é o dia da Mulher? É realmente necessário? Será que é uma concessão às mulheres da classe burguesa, às feministas e sufragistas? Será que é nocivo para a unidade do movimento operário? Estas questões ainda se escutam na Rússia, embora já não no estrangeiro. A vida mesma deu uma resposta clara e eloquente a tais perguntas.

O Dia da Mulher é um elo na longa e sólida cadeia da mulher no movimento operário. O exército organizado de mulheres trabalhadoras cresce cada dia. Há vinte anos, as organizações operárias não tinham mais do que grupos dispersos de mulheres nas bases dos partidos operários… Agora os sindicatos ingleses têm mais de 292.000 mulheres sindicalizadas; na Alemanha são à roda de 200.000 sindicalizadas e 150.000 no partido operário (…). Em toda a parte, (no Brasil), na Itália, na Hungria, na Dinamarca, na Suécia, na Noruega e na Suíça, as mulheres da classe operária estão a organizar a si próprias. O exército de mulheres socialistas tem perto de um milhão de membros. Uma força poderosa!Érica Fabíola, diretora de saúde

Houve um tempo em que os homens trabalhadores pensavam que deveriam carregar eles sós sobre os seus ombros o peso da luta contra o capital, pensavam que eles só deviam enfrentar-se ao “velho mundo”, sem o apoio das suas companheiras. Porém, como as mulheres da classe trabalhadora entram nas fileiras de aqueles que vendem o seu trabalho em troca de um salário, forçadas a entrar no mercado laboral por necessidade, porque o seu marido ou pai estava no desemprego, os trabalhadores vão começar a reparar em que deixar atrás as mulheres entre as fileiras dos “não-conscientes” era danar a sua causa e evitar que avançasse. Que nível de consciência possui uma mulher que senta no fogão, que não tem direitos na sociedade, no Estado ou na família? Ela não tem ideias próprias!

Heidiany Moreno, diretora de bancos estaduaisO atraso e a falta de direitos sofridos pelas mulheres, a sua dependência e indiferença não são benefícios para a classe trabalhadora, e de fato são um mal direto para a luta operária. Mas, como entrará a mulher nesta luta, como acordará?

(…) As organizações operárias estavam abertas às mulheres, mas só umas poucas entravam. Por quê? Porque a classe trabalhadora, ao começo, não vai dar por si que a mulher trabalhadora é o membro mais degradado, tanto legal quanto socialmente, da classe operária, que ela foi espancada, intimidada, encurralada ao longo dos séculos, e que para estimular a sua mente e o seu coração necessita uma aproximação especial, palavras que ela, como mulher, entenda. (…)Heládia Carvalho, diretora

Os socialistas em cada país começam a demandar uma proteção especial para o trabalho das mulheres, seguranças para as mães e os seus filhos, direitos políticos para as mulheres e a defesa dos seus interesses.

Quanto mais claramente o partido operário percebia esta dicotomia mulher/trabalhadora, mais ansiosamente as mulheres se uniam ao partido, mais apreciavam o rol do partido como o seu verdadeiro defensor e mais decididamente sentiam que a classe trabalhadora também lutava pelas suas necessidades. (…) Os partidos em cada país têm os seus comitês de mulheres, com os seus secretariados e birôs para a mulher. Estes comitês de mulheres trabalham na ainda grande população de mulheres não conscientes, levantando a consciência das trabalhadoras em seu redor. (…)

Assim, como membros do partido, as mulheres trabalhadoras lutam pela causa comum da classe, enquanto ao mesmo tempo delineiam e põem em questão aquelas necessidades e as suas demandas que lhes dizem respeito mais diretamente como mulheres, como donas de casa e como mães. (…)

No dia da mulher as mulheres organizadas manifestam-se contra a sua falta de direitos. Mas alguns dizem, por quê esta separação das lutas das mulheres? Por que há um dia da mulher, panfletos especiais para trabalhadoras, conferências e comício? Não é, enfim, uma concessão às feministas e sufragistas burguesas? Só aqueles que não compreendem a diferença radical entre o movimento das mulheres socialistas e as sufragistas burguesas podem pensar desta maneira.

Odineá Gonçalves, diretora de delagacias sindicaisQual o objetivo das feministas burguesas? Conseguir os mesmos avanços, o mesmo poder, os mesmo direitos na sociedade capitalista que possuem agora os seus maridos, pais e irmãos. Qual o objetivo das operárias socialistas? Abolir todo o tipo de privilégios que derivem do nascimento ou da riqueza. À mulher operária é-lhe indiferente se o seu patrão é um homem ou uma mulher.

As feministas burguesas demandam a igualdade de direitos sempre e em qualquer lugar. As mulheres trabalhadoras respondem: demandamos direitos para todos os cidadãos, homens e mulheres, mas nós não só somos mulheres e trabalhadoras, também somos mães. (…)

As feministas burguesas estão lutando para conseguir direitos políticos: também aqui os nossos caminhos se separam. Para as mulheres burguesas, os direitos políticos são simplesmente um meio para conseguir os seus objetivos mais comodamente e com mais segurança neste mundo baseado na exploração dos trabalhadores. Para as mulheres operárias, os direitos políticos são um passo no caminho empedrado e difícil que leva ao desejado reino do trabalho.

Os caminhos seguidos pelas mulheres trabalhadoras e as sufragistas burguesas separam-se há tempo. Há uma grande diferença entre os seus objetivos. Há também uma grande contradição entre os interesses de uma mulher operária e as donas proprietárias, entre a criada e a senhora… portanto, os trabalhadores não devem temer que haja um dia separado e assinalado como o Dia da Mulher, nem que haja conferências especiais e panfletos ou imprensa especial para as mulheres.

(…)

Que um alegre sentimento de servir à causa comum da classe trabalhadora e de luta simultaneamente pela emancipação feminina inspire as mulheres trabalhadoras a se juntarem à celebração do Dia da Mulher.

*Alexandra Kollontai foi a primeira mulher ministra de um governo republicano e embaixadora da História. Passou pela vicissitudes da Revolução, com as suas esperanças, conquistas sociais e tragédias políticas e militares. Jamais abandonou os seus ideias, apesar de eles terem sofrido tantos reveses da própria revolução

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