Bancários debatem responsabilidades do sistema financeiro com o meio ambiente

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Programação realizada no Sindicato fez parte das atividades autogestionadas dos Diálogos Amazônicos preparativos à Cúpula da Amazônia

Debater os impactos e as responsabilidades do Sistema Financeiro com o meio ambiente, a Amazônia e o planeta. Esse foi o objetivo do seminário realizado pelo Sindicato dos Bancários do Pará, junto com a Contraf-CUT e a Fetec-CUT Centro Norte na tarde desta segunda-feira 07/08, na sede da entidade, em Belém.

A programação, que foi transmitida ao vivo pelo YouTube e Facebook do Sindicato, fez parte das atividades autogestionadas dos Diálogos Amazônicos que antecederam a Cúpula da Amazônia, uma iniciativa do governo federal para reunir os 8 países da região e construir uma posição conjunta para ser levada à conferência do clima das Nações Unidas, a COP 28, nos Emirados Árabes, entre 30 de novembro e 12 de dezembro de 2023.

“A nossa intenção com essa atividade foi dar a nossa parcela de contribuição para um debate fundamental, que não só o nosso Estado ou o Brasil faz, mas o mundo inteiro faz, que é sobre a Amazônia. Nós entendemos que é nossa responsabilidade, como movimento sindical organizado, estabelecer um diálogo com a sociedade sobre o papel que o sistema financeiro desempenha em nosso Estado. Como sede da COP 30, nós teremos esse debate cada vez mais aprofundado até 2025 e a ideia é que ele possa produzir mudanças na nossa região”, afirmou a presidenta do Sindicato dos Bancários do Pará, Tatiana Oliveira, na abertura do seminário.

Investimentos dos bancos públicos na Amazônia

Na primeira parte do evento houve apresentação de dados financeiros investidos pelos bancos no desenvolvimento regional da Amazônia, com participação de Karina Colares, que representou a superintendência de Habitação da Caixa no Pará; Carmo Domingues Neto, superintendente executivo de Varejo da Caixa – Belém Leste/PA; Paulo Arévalo, diretor administrativo do Banpará; Roberto Felipe Ribeiro, engenheiro agrônomo do Banpará; Bruno Coelho, gerente de Mercado do Banco do Brasil; Gilberto Burlamaqui, assessor da agência de negócios do Banco do Brasil; e Samara Farias, coordenadora de Desenvolvimento Sustentável do Banco da Amazônia.

A Caixa apresentou algumas ações em habitação, através do Minha Casa Minha Vida, além de dados sobre o Seguro Defeso. O Banpará apresentou seus produtos e sua capilaridade no estado. O Banco da Amazônia falou sobre sustentabilidade e crédito ao agronegócio e agricultura familiar. E o Banco do Brasil disse que o banco tem o ‘agronegócio na veia’ e que a Agricultura Familiar é igual aos grandes produtores, o que gerou críticas dos participantes.

“A atuação do sistema financeiro tem grande impacto na Amazônia e em seus problemas, mas o setor é pouco responsabilizado. Os dados apresentados comprovam que a maior parte dos financiamentos são direcionados ao agronegócio, ao boi, à soja. O que precisamos é investimentos nos pequenos produtores, na população que vive e mantém a Amazônia viva”, disse a vice-presidenta do Sindicato dos Bancários e da CUT Pará, Vera Paoloni.

A presidenta da CUT Pará, Euci Ana, complementou afirmando que “o sistema financeiro precisa efetivamente ter responsabilidade com a vida, com a Amazônia e com o meio ambiente. Não é possível continuar esse financiamento medonho para soja, boi em larguíssima escala em detrimento do financiamento aos pequenos, às mulheres que são a maioria das chefas de família”.

Seu ‘Goianinho’, trabalhador rural e líder sindical e quilombola na cidade de Baião, região do Baixo Rio Tocantins, falou que muitos empresários têm comprado as terras da população tradicional da região para promover desmatamento às margens do rio e intensificar plantações de milho, sem nenhuma fiscalização ambiental.

“O Banco da Amazônia e o Banco do Brasil vieram aqui nesse debate para dizer que financiam o agronegócio, mas lá no nosso município não financiam nenhum pequeno produtor. E não é porque não temos trabalhadores organizados, pois temos sindicatos organizados, temos cooperativas organizadas, temos associações quilombolas, tudo organizado, o problema é que eles só financiam o agronegócio e esquecem do trabalhador rural. Esse financiamento que foi mostrado aqui nas apresentações é muito bonito, mas não é essa a nossa realidade”, critica.

Construção de sociobioeconomias da Amazônia

A segunda parte do seminário debateu “o sistema financeiro e o ramo financeiro no financiamento do desenvolvimento regional e na construção de sociobioeconomias da Amazônia”, com as contribuições de Danillo Fernandes, professor e coordenador do Programa de Pós-graduação em Economia – PPGE e pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/UFPA; e Daniel Gaio, secretário nacional de meio ambiente da CUT Brasil.

O professor Danillo Fernandes explicou que o conceito de bioeconomia vem de uma agenda internacional com preocupações sobre mudanças climáticas, emissão de gases do efeito estufa, descarbonização, mudança de matriz energética, e que ela não pode ser entendida apenas como biocombustível, bioenergia, e sim como a economia de um bioma e sua diversidade, que já existe na Amazônia e é a economia das populações ribeirinhas, indígenas, quilombolas e povos tradicionais da floresta.

“Essa bioeconomia bioecológica que é apresentada como a grande novidade do século XXI já é praticada há séculos pela população amazônica, que explora a diversidade da floresta para sua segurança alimentar e para geração de renda, mas isso é invisibilizado pelos interesses da cultura homogênea do agronegócio. Essa população domina o manejo do açaí, da pesca, constrói embarcações, produz artesanatos, ou seja, essa bioeconomia do futuro é a nossa economia popular da Amazônia, está bem diante do nosso nariz, mas que parece invisível pela visão de progresso que nos é vendida, e essa nossa bioeconomia garante soberania alimentar, garante biodiversidade, mantém florestas vivas e só os serviços ambientais que elas geram já são financeiramente capazes de justificar a sua existência ”, destaca o pesquisador.

Por outro lado, ele observa que os grandes investimentos do sistema financeiro na Amazônia são voltados para infraestrutura, assistência técnica, escoamento e crédito para poucos produtos, principalmente milho, soja e gado, que transformam a região em um eixo de exportação do centro oeste, modelo que vem sendo desenvolvido desde a década de 90 e que é incompatível com o bioma amazônico.

Danillo Fernandes entende que as mudanças necessárias para que se possa alcançar o objetivo de convergência entre uma economia que cresça, que promova distribuição de renda e supere o subdesenvolvimento na Amazônia dependem de uma mudança de paradigma na política econômica.

“Essa mudança de paradigma significa dizer que o sistema financeiro deve acompanhar esse movimento, a gente deve entender que uma economia que preserve o bioma, seja a Amazônia ou os mais diversos biomas do planeta, não pode crescer com a homogeneização. As formas de produção que homogeneizam os espaços, como as grandes commodities, são incompatíveis com a necessidade de produção com diversidade. Um bioma como a Amazônia só será preservado se o seu modo de produção econômico for o mais diverso possível, e o sistema bancário, o sistema financeiro, o sistema que financia essa atividade produtiva precisa ter essa capacidade de compreender essa mudança de paradigma. Esse é o grande desafio do século XXI e a gente precisa debater isso”, defende.

Organizar a classe trabalhadora da Amazônia

O bancário empregado da Caixa e secretário de meio ambiente da CUT Brasil, Daniel Gaio observou que a classe trabalhadora da Amazônia precisa se apropriar sobre esse debate de modelo de desenvolvimento na região. Porém, ele observa que a partir das visitas que fez a todos os países que fazem parte da região, o maior grau de desorganização sindical está na Amazônia, devido aos fortes ataques que esses trabalhadores e trabalhadoras sofrem pelas forças do capital.

Ele afirma que a próxima COP 28 está sendo chamada pelo sistema financeiro de ‘COP do financiamento’, pela criação da narrativa de que o grande problema do mundo é a falta de dinheiro, como se o dinheiro não fosse o real problema do mundo.

“Precisamos observar nesse discurso que quanto mais financiamento se tem na Amazônia, piores são as condições de trabalho, maiores são os incentivos ao desmatamento, maiores os incentivos a perda de biodiversidade. Então o problema não é financiamento, o problema é o modelo de produção econômica e o sistema financeiro, e os bancos que são os grandes financiadores disso tudo, tem muita responsabilidade nessa discussão. Portanto, o Sindicato dos Bancários, a Contraf-CUT e Fetec-CUT Centro Norte estão de parabéns por fazer essa discussão que cada vez mais deve estar presente nas mesas de negociação de acordos coletivos e demais negociações da categoria com os bancos”, afirma Daniel Gaio.

Ao final foi feita a exibição do documentário produzido pela CUT Pará sobre os impactos da Hidrovia Araguaia Tocantins e o desmonte do Pedral do Lourenção para a população que vive às margens desses rios.

 

Fonte: Bancários PA

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