8M: Pandemia adoece também a saúde mental. Mulheres são as mais afetadas. Entenda e peça ajuda!

0

Medo de perder o emprego, medo de se contaminar ou contaminar um familiar, medo de morrer ou perder alguém que ama. A pandemia gerou vários tipos de medos e receios afetando a saúde mental das pessoas e mais uma vez, as mulheres foram as mais afetadas emocionalmente, como revela uma pesquisa do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, conduzido pela equipe do neuropsicólogo Antônio de Pádua Serafim.

O estudo, realizado entre maio e junho do ano passado, com homens e mulheres de várias regiões do país (26 estados brasileiros e o Distrito Federal) mostrou que 40,5% das mulheres entrevistadas apresentaram sintomas de depressão, 34,9% de ansiedade e 37,3% de estresse.

A pesquisa não detalha as razões que levaram as entrevistadas a terem maior sofrimento psíquico, mas a psicóloga, Laura Nogueira, que participou da última live do Sindicato (assista aqui), com o tema “Pandemia e adoecimento mental no trabalho”, explica que qualquer mudança brusca na rotina traz impacto à saúde mental.

“A pandemia trouxe dois grandes problemas que afetam o psicológico de qualquer ser humano: adoção de estratégias de adaptação de forma super rápida, o que gera um estresse; sendo que essa responsabilidade ficou principalmente para as mulheres, pois a sociedade já nos rotula como cuidadoras, e a área da enfermagem é um exemplo disso, onde a grande maioria é de mulheres. Então quem já tinha uma rotina dupla, às vezes tripla, teve que desenvolver tudo isso no mesmo espaço, a casa. O outro problema tem a ver com o isolamento, que fez nos afastarmos de pessoas que amamos, mas não moram com a gente. A gente nasceu pra viver junto de outras pessoas, e a tecnologia não dá conta de todas as necessidades humanas , a do toque, a do abraço, a de conversar olhando nos olhos”, explica a psicóloga.

Já para quem não pôde ficar em casa, a saúde mental também foi atingida a partir das preocupações em contrair o vírus e levar para dentro de casa, além das mudanças na rotina de trabalho que passaram a exigir cuidado redobrado como medida de prevenção à covid-19: uso de máscaras, álcool em gel e o distanciamento social.

“De um modo geral todos foram pegos de surpresa, principalmente aqueles que estão na linha de frente, especialmente os da área da saúde. Mas os outros trabalhadores logo tiveram que se organizar. Os serviços essenciais, por exemplo, onde a categoria bancária se enquadra, não puderam ir de imediato pra casa esperar a pandemia passar. As medidas de proteção contra a covid-19 infelizmente não protegem nossa saúde mental”, destaca Laura Nogueira.

E não foi somente o cumprimento dos protocolos de segurança contra a covid-19 que foram redobrados, quem continuou trabalhando presencial ou foi para home office sentiu na pele o aumento na jornada de trabalho.

“A rotina do bancário sempre foi exaustiva, principalmente devido à cobrança de metas, mas nessa pandemia, a rotina mudou pra pior, os colegas da Caixa que o digam que tiveram que trabalhar aos sábados para dar conta dos pagamentos do auxílio emergencial. Os bancários e bancárias de bancos privados também tiveram sobrecarga de trabalho nessa pandemia”, conta a presidenta do Sindicato e bancária da Caixa, Tatiana Oliveira.

No Itaú, além das demissões, o banco dobrou as metas exigidas dos trabalhadores pelo programa AGIR, ligado à remuneração variável dos funcionários, com uma série de itens de vendas e atendimento a serem cumpridos. Tudo isso em plena pandemia, momento em que a comercialização de produtos bancários está muito mais difícil. Diante do aumento do desemprego, alta dos preços de itens da cesta básica, da gasolina, planos de saúde, muitos clientes e usuários tiveram que cortar despesas para tentarem garantir o básico para suas famílias.

Uma bancária do Itaú na Região Metropolitana de Belém, que prefere não ser identificada, conta que teve que retornar ao trabalho, mesmo apresentando sintomas da covid-19.

“Eu ainda não tinha feito o teste, mas estava com muita tosse e informei a minha gestora que mesmo ciente, me pediu para voltar e assim o fiz. Minha situação só piorou, diante da sobrecarga de trabalho, estávamos entrando às 9h, nosso horário de almoço de 1h foi reduzido em meia hora para dar conta da demanda, e mesmo o banco fechando às 15h tínhamos que ficar até 17h para bater metas, e ainda éramos questionados sobre as horas extras. Sem falar que os protocolos de prevenção firmados entre a Fenaban e os sindicatos não eram devidamente cumpridos: ao invés de 5 pessoas do lado de dentro da agência para serem atendidas, entravam 10 sem qualquer tipo de respeito ao distanciamento”, conta.

No dia seguinte, a tosse da bancária só piorou, ela informou mais uma vez à gestora e buscou atendimento no Hospital de Campanha no Hangar, fez o teste e no dia agendado para ela pegar o resultado, a bancária acabou indo para emergência e ficou internada.

“Minha tosse foi só piorando e ao medirem minha saturação, ela estava muito baixa, tive que ir pro oxigênio, e mesmo assim nada de minha saturação aumentar, o que só aumentava era meu cansaço, até que me levaram para a UTI onde fui intubada”, lembra a bancária de 27 anos sem nenhuma comorbidade, que tinha uma vida saudável tanto na alimentação quanto na prática de atividades físicas.

Foram 19 dias na Unidade de Terapia Intensiva, sem visitas, com poucas memórias e muita dor. “A maior parte dos dias fiquei desacordada, mas os médicos me contaram depois, que mesmo assim estava muito agitada e por conta disso foram me tirando da sedação. Quando eu despertei, nem eu sabia onde estava, mas lembro de que era só eu de paciente naquela sala acordada vendo gente morrer todos os dias. Eu precisava sair dali e reuni forças através da minha fé e da leitura de livros que pedia para o meu marido, através de cartas, já que visitas eram proibidas”, diz com a voz emocionada e também cansada, por conta das sequelas que a covid-19 deixou.

O coronavírus comprometeu cerca de 80% do pulmão dela, além disso, a bancária conta que tem vários espasmos do lado esquerdo do corpo, desenvolveu fibrose pulmonar, uma doença que não tem cura, mas com o tratamento adequado é possível melhorar a respiração, evitar que a doença avance e, principalmente, permitir que o paciente tenha mais qualidade de vida. Por isso a bancária toma várias medicações e a cada 15 dias tem consulta com pneumologista, e também faz sessões de fisioterapia motora e pulmonar.

“Dia 14 faz um mês que eu revivi, foi o dia que voltei pra minha casa. Mesmo sabendo que tenho um longo tratamento pela frente, estou feliz de poder estar em casa e não mais naquela UTI, levando 7 furadas por dia. Hoje eu não consigo fazer mais nada do que fazia antes, até caminhar me cansa. Não posso receber visitas, porque o risco de uma reinfecção é alta e pode me levar à morte, mas o apoio que tenho recebido de colegas, da minha família e principalmente do meu marido, tem sido fundamentais para minha recuperação”, afirma.

Além das dores físicas que a bancária ainda sente por conta das sequelas, existe ainda outra dor que abalou o psicológico dela, não só pelos dias que ela passou internada, mas pela falta de preocupação do banco para com ela e pelo desprezo, sentimento que ela define.

“Mesmo eu apresentando todos os atestados, o banco se negou a emitir minha CAT, sequer cadastraram no sistema do Itaú os documentos que o hospital me deu e meu marido entregou para justificar meus 19 dias de ausência, por conta disso, tive mais de mil reais de desconto no meu salário e agora aguardo o INSS liberar meu auxílio-doença. Para não dizer que não tive nenhuma assistência do banco, uma psicóloga me ligou nos primeiros dias da minha alta médica, mas tudo que ela conseguia me dizer era que tudo ia passar e eu ia ficar bem”, relata.

Para conseguir o Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT), a bancária procurou o Sindicato que imediatamente emitiu o documento, mas que foi recusado pelo INSS, que alegou a CAT a ser apresentada deveria ser a expedida pelo banco, que não o fez. A bancária conseguiu a concessão do benefício após perícia médica. Mas o Sindicato vai tentar reverter na Justiça o tipo de auxílio, já que a bancária foi vítima de acidente de trabalho, com base em todos os documentos médicos.

Em dezembro do ano passado, o Ministério Público do Trabalho afirmou, em nota técnica elaborada pelo Grupo de Trabalho, que a Covid-19 pode ser considerada doença do trabalho quando a contaminação do trabalhador pelo vírus ocorrer em decorrência das condições especiais de trabalho.

“A Covid-19 é um risco biológico existente no local de trabalho, e, despeito de ser pandêmica, não exclui a responsabilidade do empregador de identificar os possíveis transmissores da doença no local de trabalho e as medidas adequadas de busca ativa, rastreio e isolamento de casos, com o imediato afastamento dos contatantes, a serem previstas no Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional, elaborado sob responsabilidade técnica do médico do trabalho, nos termos da alínea “d” do item 4.12 da NR 04)”, diz trecho do documento.

Quando buscar ajuda?

A psicóloga Laura Nogueira explica que o primeiro passo é ficar atento ao que pensamos e sentimos e a frequência desses tipos de sentimentos e pensamentos. “Infelizmente nem sempre conseguimos identificar que isso pode ser um anuncio de alguma problema psicológico, pois podemos associá-los a diversos outros fatores, que podem ser momentâneos, mas os sentimentos e pensamentos, às vezes repercutidos na fala, não são passageiros. Por isso, é importante também permitir quando o outro percebe mudanças no nosso comportamento e falas – como quero sumir, se eu morrer ninguém vai sentir minha falta”, explica a especialista.

“Quase todo dia atendemos por telefone um bancário ou bancária com problemas físicos ou psíquicos. Sabemos que pedir ajuda nem sempre é uma decisão fácil, mas nós estamos aqui para orientar os colegas da melhor forma possível, encaminhar a profissionais, emitir CAT. Não precisa ter vergonha de procurar ajuda, a saúde mental é tão importante como a saúde do corpo”, destaca a diretora de saúde do Sindicato e bancária do Bradesco, Heládia Carvalho.

Um campo de estudo entre a medicina e a psicologia, denominado psicossomática, parte do conceito de que as emoções afetam alguns processos orgânicos do corpo ou podem aumentar o risco de desenvolver ou agravar certas doenças. Uma crise de ansiedade, por exemplo, pode vir acompanhada de calafrios, taquicardia, sudorese, falta de ar e tontura. No caso da síndrome de pânico, esses efeitos são mais atenuantes e podem ser confundidos com um ataque cardíaco.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a saúde emocional e física são áreas interdependentes na vida de um indivíduo e precisam do mesmo nível de cuidado.

 

Fonte: Bancários PA com Portal UOL e Cuidados Mil

Comments are closed.