MP que autoriza redução salarial e suspensão de contratos é questionável

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Centrais sindicais vão sistematizar propostas a serem levadas ao Congresso e apresentadas como emendas.

A Medida Provisória (MP) 936, que possibilita a suspensão dos contratos de trabalho ou a redução das jornadas e salários em função da crise decorrente da pandemia de coronavírus, pode ser votada ainda nesta sexta-feira (3) pelo Congresso Nacional. As centrais sindicais se reuniram remotamente nesta quinta-feira (2) e criticaram a MP 936. Os dirigentes também reprovaram as iniciativas adotadas até agora pelo Executivo federal, que privilegiaria o sistema financeiro.

“A resposta do governo, ante à pandemia e a redução da atividade econômica, é tímida, indigesta e extremamente insignificante frente ao montante de recursos disponibilizados para o setor financeiro”, afirmam as centrais em nota.

Inconstitucionalidade

Para as entidades, os acordos entre trabalhadores e empregadores não podem ser individuais. Os sindicalistas informaram que, ainda hoje, vão sistematizar propostas a serem levadas ao Congresso e apresentadas como emendas.

“Ressaltamos que a Constituição brasileira garante o acordo coletivo justamente porque no acordo individual o trabalhador sempre sai prejudicado”, afirmam ainda, orientando os empregados a procurar seus sindicatos.

Qualquer medida deve respeitar o artigo 7º da Constituição, que só permite redução salarial por meio de acordo coletivo, e a participação das entidades sindicais em todas as negociações. Além disso, os salários devem ser mantidos integralmente, “de forma a manter o poder de compra e fomentar uma retomada econômica”. As centrais propõem ainda 180 dias de estabilidade, prorrogação do seguro-desemprego e isenção de tarifas.

Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) também publicaram nota pública criticando a possibilidade de efetuar redução de salário e jornada e suspensão de contrato por meio de acordo individual.

A MP prevê que, durante o estado de calamidade pública em razão da pandemia da covid-19, o empregador poderá acordar com o empregado a redução proporcional da jornada de trabalho e salário, por até 90 dias, sendo preservado o valor do salário-hora de trabalho. Poderão ser feitas reduções de 25%, 50% ou 70%.

O empregado que tiver sua jornada e salário reduzidos terá direito ao Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, custeado com os recursos do seguro-desemprego. O valor a ser recebido pelo governo vai depender do salário do trabalhador e da porcentagem da redução. Por exemplo, se o salário bruto do trabalhador é R$ 1500 por mês, e houver redução de 50% no salário e jornada, o salário passa a ser de R$ 750 mensais. É sobre esta base de cálculo que o valor do benefício emergencial será calculado.

Outra possibilidade trazida pela medida provisória é a suspensão temporária do contrato de trabalho, que poderá durar até 60 dias – podendo ser fracionada em dois períodos de 30 dias. Nesta hipótese, a empresa deverá manter os benefícios que o empregado já recebe, e companhias que tiveram receita bruta anual de R$ 4,8 milhões ou mais no ano passado deverão pagar 30% do “salário”, que na verdade será um auxílio sem caráter salarial, sobre o qual não incidem contribuições. Neste caso, a União paga 70%. No caso de empresa com receita inferior, a União pagará 100%.

Tanto a redução salarial e de jornada quanto a suspensão do contrato poderão ser feitas mediante acordo individual formal para quem ganha até R$ 3.135,00 ou para quem ganha mais de R$ 12.102,00. Para os trabalhadores cujos salários estiverem entre esses valores, o acordo coletivo é obrigatório.

Para o advogado trabalhista Mauro Menezes, sócio do Mauro Menezes & Advogados, a MP afronta a Constituição. “A Constituição, no artigo 7º, não admite alteração que reduza salário ou jornada sem que haja uma negociação coletiva sindical, ou seja, o sindicato tem que participar. Toda experiência das relações de trabalho demonstra que não havendo possibilidade de intervenção da entidade sindical, a renúncia a direitos é algo que não deve ser feita individualmente. A Constituição não permite, nem mesmo nas situações de crise, que haja reduções de salários sem que isso seja produto de uma negociação coletiva”, opina.

Valorização dos sindicatos

Segundo o Dieese, os parlamentares devem reduzir ao máximo as perdas nos rendimentos dos trabalhadores formais, além de garantir estabilidade com a participação dos sindicatos.

Segundo o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Junior, trabalhadores com salários acima do teto do seguro-desemprego, que é de R$ 1.813,03, sofrerão “perdas substanciais”. Os funcionários também poderão ter jornadas reduzidas entre 25%, 50% e 70%, que receberão parcela proporcional do seguro, também registrando perdas que podem chegar a até 30%. “De fato, vai haver redução. Para quem ganha menos, a redução é menor. Para quem ganha mais, a redução é maior. O Congresso precisa diminuir ao máximo essa diminuição da renda real dos trabalhadores. O ideal seria que o governo suportasse a folha de pagamento, para manter o máximo de renda real”, afirmou Fausto.

Fonte: Contraf-CUT

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